Que estranho é o fato de pessoas de sensibilidade e sentimentos honestos, que não tirariam vantagem de um homem que nasceu sem braços ou pernas ou olhos, não verem problema em maltratar um homem com pouca inteligência.
Charlie Gordon é um rapaz de 32 anos com deficiência intelectual por causa da fenilcetonúria, que foi escolhido para um experimento científico a fim de “curar” sua limitação: uma cirurgia que permite que aprenda e absorva o conhecimento que não foi possível durante sua vida.
Sua história inicia-se por meio de relatórios escritos por ele, a partir da preparação para o procedimento, demonstrando sua visão ingênua sobre o mundo e sobre si. Percebemos em seus primeiros escritos, não apenas os erros de português (que nos causam um certo incômodo na leitura), mas a sede por aprender, por atender as expectativas de terceiros, bastante credulidade e docilidade. Por meio desses relatórios Charlie vai contando sua história e informando ao leitor qual o seu lugar no mundo e como está inserido na sociedade.
Após a cirurgia percebemos a mudança para o “novo” Charlie. Os erros de português começam a diminuir, até desaparecer, as sombras do passado tornam-se mais nítidas, as situações de preconceito, abuso e humilhação que antes ele classificava como engraçados ou gestos de amizade tornam-se claras e evidentes e ganham o nome do que realmente são.
Percebemos um Charlie que se desenvolve intelectualmente de forma exponencial, entretanto seu crescimento emocional não é acompanhado.

Charlie aprende idiomas, cálculo, física, ciência, psicologia, literatura, música, artes, e faz inúmeras descobertas em diversas áreas do conhecimento humano, o que seria impossível em apenas uma vida. Entretanto, sua forma de relacionar ainda é primitiva, o que faz com que algumas vezes pareça arrogante e ingrato. Mas aqui há uma das tantas camadas que esse livro possui: Charlie estava sendo arrogante, ou as pessoas esperavam que ele continuasse passivo e tímido? É possível aprender tanto e manter algumas características? As pessoas não estavam preparadas para serem superadas por alguém que antes elas zombavam ou tinham compaixão?
Se Charlie é o nome do personagem principal, quem é Algernon? É o rato de laboratório que foi submetido ao mesmo experimento do protagonista. No início Charlie desenvolve com ele um sentimento de competição e raiva, por achar Algernon bastante evoluído, mas logo que Charlie consegue ultrapassá-lo percebe que há mais semelhanças do que ele imaginava.
Eu lembro que quando ouvi sobre esse livro me causou curiosidade, mas não interesse. De imediato, imaginei que seria um livro que o Samuel gostaria e não me enganei. O interesse veio não apenas quando ele começou a falar, mas a forma cheia de emoção que ele me contava em cada passagem.
Se eu pudesse conceder atributos a esse livro, como fazemos com as pessoas, diria que ele é melancólico e solitário e concordo com o Samuel: é um livro que deve ser lido mais de uma vez.
Livro: Flores para Algernon
Autor: Daniel Keyes
Ano: 1959